Não mais, nem menos, meio.
limão sem suco
cachorro afônico
perdeu a conta de quantas vezes foi ao dicionário procurar as palavras.
(não porque soubesse escrever ou falar e exprimir-se queria.
isso tudo lhe era estranho.
apenas buscava saber o nome daquilo que lhe espremia.)
sentiu a morte (ou a vida?) roendo os cantos
arredondando tudo ao redor, aparando arestas:
achava meio, arredondava pra zero.
(com os códigos e números se dava bem.
estes eram sólidos, por nunca terem existido.)
sabia que o intermédio entre si e ti
é ponte de areia, enigma egípcio
que, ao se desvendar, desmancha.
e a morte (ou a vida?) atravessou esse meio.
julgava-se medíocre apesar de ter muitas metades.
apesar da multidisciplinaridade,
eram só metades.
e a vida (ou a morte?) arredondou todos esses meios também.
pensou: vida é estação tumultuada
com tantos desencontros se esbarrando,
vão se esgueirando, tomam um trem e te encontram na vida passada.
e a própria morte (ou a vida?) se perdeu nesse meio.
hoje percebe que ontem imaginou
fabricar esses zeros todos
e imagina que se soubesse chorar
eles cairiam azedos de seus olhos.
(não que tivesse motivo para tanto
pois em meio ao pranto
poderia a vida, ou a morte,
vir bebê-lo desse meio também.)